As causas suspensivas da exigibilidade do crédito tributário estão previstas no 151 do CTN, a saber: a moratória, o depósito de seu montante integral, as reclamações e os recursos administrativos, a liminar em mandado de segurança, a liminar e a antecipação de tutela em outras ações judiciais e o parcelamento.
Se abstrairmos as reclamações e os recursos administrativos, de cuja solução depende o encerramento do contencioso administrativo tributário, as demais hipóteses inseridas no citado rol legal podem se fazer presentes quando o crédito tributário já esteja definitivamente constituído.
Sabe-se que uma vez que o crédito tem a sua exigibilidade suspensa, fica a Fazenda Pública impedida de propor a execução fiscal, que é o mecanismo judicial próprio para a respectiva cobrança. Também é de conhecimento geral que o executivo fiscal se ampara em título executivo extrajudicial, qual seja, o termo de inscrição em dívida ativa, materializado – ou espelhado – na correspondente certidão (a certidão de dívida ativa, ou CDA).
A inscrição de um crédito tributário em dívida ativa, por sua vez, traduz ato administrativo de controle da legalidade do procedimento administrativo fiscal (Lei nº 6.830/80, art. 2º, §3º), que cria o título hábil a lastrear a execução fiscal. O agente da Administração Pública a quem compete inscrever o crédito fazendário torna-se o “juiz” do procedimento administrativo de constituição deste, podendo (e devendo) determinar a anulação e o refazimento de atos viciados, com o que evitará futuras nulidades no processo judicial de cobrança.
Devidamente inscrito, o crédito passa a ser considerado líquido e certo (Lei nº 6.830/80, art. 3º e CTN, art. 204), exatamente por haver sido submetido, com sucesso, a essa etapa de controle interno de legalidade. Além disso, o crédito qualificado como dívida ativa passa a ostentar o atributo processual da exequibilidade, ou seja, torna-se passível de cobrança judicial.
Questão interessante refere-se à possibilidade de um crédito definitivamente constituído na esfera administrativa ser inscrito no registro da dívida ativa mesmo estando com a exigibilidade suspensa. Uma resposta negativa a essa indagação é a que mais se encontra em manuais jurídicos, mas a fundamentação revela-se quase sempre deficiente, escorada em puro aspecto prático: “se não pode ser cobrado judicialmente, de que adianta ser inscrito?”.
Esse suposto pragmatismo, entretanto, não resiste ao exame da norma do art. 185 do CTN, com a redação que lhe foi dada pela Lei Complementar nº 118/2005. De fato, a previsão normativa aludida passou a indicar que a inscrição do crédito tributário em dívida ativa estabelece o marco a partir do qual a alienação de bens que torne insolvente o devedor caracteriza fraude à execução fiscal.
Ora, a redação atual do art. 185 do CTN cria importante garantia ao crédito tributário regularmente inscrito, a impedir que devedores livrem bens da futura penhora em execução fiscal e se coloquem voluntariamente em posição de insolvência frente ao Fisco, frustrando assim as necessidades arrecadatórias do Estado. Com isso, qualquer mutação na situação patrimonial do devedor que prejudique a Fazenda Pública será considerada ineficaz em relação a ela, quando realizada após a inscrição em dívida ativa.
Já vimos que a inscrição em dívida ativa é ato unilateral, de iniciativa do credor, tendente à constituição do título executivo com que se apresentará o Fisco em juízo para cobrar seu crédito. Inscrever o crédito em dívida ativa não se assimila a exigir o crédito, donde não se pode – com a devida licença de quem pensa o contrário – apontar ofensa ao mandamento do art. 151 do CTN pela prática do ato.
É dizer, além de aparelhar a Fazenda Pública para a cobrança judicial, a inscrição em dívida ativa implementa em favor do crédito tributário a importante garantia que está prevista no art. 185 do CTN. Não se deve esquecer que há casos em que a suspensão da exigibilidade perdura por muito tempo – como ocorre com decisões liminares em ações judiciais que se arrastam por longos anos –, não sendo razoável que o Fisco careça de relevante e típico instrumento de manutenção da utilidade da execução a ser proposta.
A orientação contrária interessa apenas ao contribuinte de má-fé, que planeja estorvar o executivo fiscal a ser manejado contra si. O de boa-fé não pode vislumbrar nenhum tipo de restrição à inscrição de um crédito que esteja com a exigibilidade suspensa, pois a situação de “regularidade fiscal” não sofre alteração com o ato, sendo mesmo passível de certificação, na forma do art. 206 do CTN (que trata da certidão positiva com efeitos de negativa).
Um argumento final: algo impede que um crédito já inscrito em dívida ativa venha a ter sua exigibilidade supervenientemente suspensa? Claro que não. O contribuinte pode impugnar judicialmente um crédito inscrito, exemplificativamente através de ação anulatória, e obter uma liminar que suspenda a exigibilidade deste. Também pode, no mesmo caso, optar por um parcelamento, quando a lei correlata não faça restrição a créditos inscritos.
Ocorrendo alguma dessas situações, o ato de inscrição em dívida tem os seus efeitos paralisados ou sustados em função da superveniente presença de uma causa suspensiva da exigibilidade do crédito que dele fora objeto? A resposta é induvidosamente negativa. Uma liminar concedida ao contribuinte – ou um parcelamento deferido a ele – não terá o condão de suprimir essa importante garantia do crédito tributário inscrito, a proteger o Fisco contra alienação de bens que levem o devedor à insolvência.
Isso só demonstra que os institutos da suspensão da exigibilidade e da inscrição em dívida ativa são plenamente compatíveis entre si. A regra do art. 201 do CTN define, como requisito para a inscrição, unicamente que esteja esgotado o prazo fixado, para pagamento, pela lei ou por decisão final proferida em processo regular, sem qualquer tipo de menção à plena exigibilidade do crédito a ser inscrito.